Pais extenuados: “sinto grrrrr! nas veias”
“Ele há dias”, como se costuma dizer, ele há dias em que nos apetecia invocar a presença do Rei Herodes, ou subverter a frase bíblica e exclamar: “Deixai ir as criancinhas!”.
É que, caros leitores, os pais, mesmo que sejam santos, não são masoquistas nem mártires da Jihad, e por vezes sentem-se “sós e abandonados, pobres e oprimidos” quando aquelas pequenas criaturas, estilo Gremlins em formato caseiro, resolvem atacar, seja com ruído que ultrapassa o que a lei permite – é verdade: tenho medido os decibéis dos gritos (ou será guinchos?) de meninos , no consultório, e ultrapassam os 80dB, o que pode causar lesões graves no sistema auditivo –, seja com pedidos constantes (“Ó pai, isto…”; “ó mãe, aquilo…”) ou litigâncias fraternais, com o inefável “Pááááára!” ou o “Ó mãe, olhe ela!”, entre outras mil coisas, algumas tão corriqueiras como chegar do trabalho, extenuados, depois de um dia “daqueles” e sentir uma fragrância que nos vai obrigar (numa autêntica sentença judicial sem recurso) a mudar uma fralda indescritível do ponto de vista cénico e estético.
Ser pai ou mãe é uma tarefa difícil, mesmo que altamente recompensadora. O saldo é positivo? É, sim senhor. Não tenho qualquer dúvida relativamente a esta questão e não é por ter cinco filhos que o digo.
Todavia, quem afirmar que nunca teve, na sua parentalidade, momentos em que apetece largar tudo e ir para uma ilha deserta ou fugir a sete-pés e, à boa maneira de um filme de Hollywood, afogar as mágoas nos ouvidos do barman mais próximo, mente. Mente descaradamente, como sói dizer-se. Se alguém questiona esta indubitável verdade, que se socorra do Polígrafo. A resposta estará lá, irrefutável. Mente.
Mal daqueles pais que nunca têm (ou fingem não ter!) momentos de desespero, em que sentem que as suas liberdades constitucionais estão seriamente ameaçadas… por um ou mais filhos que, incessantemente, sem dó nem piedade, lhes extorquem o osso, o tutano e… a energia e o tempo. Ah, pois, o tempo, esse devorador das pessoas e das vidas, do lazer e do ócio, da reflexão e da intimidade e contemplação.
Há realmente dias em que nos apetece “termos um romance connosco próprios”, e é quando ainda estamos a mirar, no espelho, aquele ou aquela que é das mais importantes pessoas da nossa vida, que eles irrompem, soltando gritos tribais, grunhindo ordens e vontades, urrando porque “a mana é uma parva” ou “o mano é um palerma”.
Que fique claro: amamos os nossos filhos e damos a vida por eles. Tentamos responder às suas necessidades irredutíveis, muitas vezes também às coisas mais supérfluas e, tantas vezes, aos seus incontáveis caprichos. Todavia, não somos maus pais nem é preciso telefonarem já para a CPCJ quando nos passa pela cabeça a frase: “Porque é que eu não pensei nisto?” ou “Onde se compra um bilhete para a nave de lugar e sentido único que me levará para Saturno?”.
Pensar isto é normal. Passar à ação, dizer-lhes isto “em direto”, fazer-lhes ver que, de alguma maneira, são mal-vindos, isso é que será muito, muito errado. Daí a necessidade de ter tempos únicos, solitários ou com a pessoa que faz parte do nosso amor adulto, livres de crianças e em que regressemos ao nosso mundo sem termos a grilheta de, para sempre, sermos uns Peter Pans na Terra do Nunca. Depois disso seremos melhores pais, mais disponíveis, e melhores pessoas, mais satisfeitas e com menos stress.
Daí a necessidade de ter tempos únicos, solitários ou com a pessoa que faz parte do nosso amor adulto, livres de crianças e em que regressemos ao nosso mundo sem termos a grilheta de, para sempre, sermos uns Peter Pans na Terra do Nunca. Depois disso seremos melhores pais, mais disponíveis, e melhores pessoas, mais satisfeitas e com menos stress.