O bebé é um comunicador competente. Saiba qual a importância de valorizar as suas competências e como ajudá-lo a desenvolver a linguagem.
Texto: Ana Margarida Marques | Ilustração: Jaime Ferraz

Teresa Sameiro explica como são surpreendentes as competências que os bebés trazem à nascença. 

No útero, o bebé já reconhece vozes, sente cheiros, tem perceções sensoriais do que se passa cá fora. 

Consoante as suas aptidões físicas (agarrar, largar, levar à frente dos olhos, atirar), há que permitir ao bebé a exploração do ambiente pelos cinco sentidos. 

Segundo a terapeuta: “A comunicação é tudo. A primeira comunicação é quase animal: a suavidade ou a firmeza do toque, o contacto do olhar, o cheiro, o tom de voz, a expressão facial”.

Dos zero aos nove meses

O bebé é um comunicador competente, mesmo que ainda não se exprima por palavras. Comunica quando chora, quando grita, quando palra, quando ri. 

A terapeuta da fala alerta para a importância das primeiras interações na aquisição de requisitos para a comunicação.

“A comunicação entre os pais e o bebé começa muito antes da aprendizagem das primeiras palavras”, refere Paula Bravo: “O bebé vai responder aos estímulos da comunicação com padrões que vão encadeando o focar da atenção, o sorriso, os movimentos oro-faciais (bochechas, lábios e língua), os gestos e as vocalizações.” 

Cria-se um diálogo em torno dos afetos, que contribui grandemente para o desenvolvimento das capacidades comunicativas e para a aquisição da fala.

As interações precoces levam à apreensão de uma capacidade de atenção mútua: a criança vai começar a dar atenção ao outro, estabelece o contacto visual, a imitação motora e vocal, reconhece expressões faciais, a entoação, aprende a melodia, o ritmo do discurso, assim como as regras do diálogo. 

Segundo Paula Bravo, a criança começa a perceber a causa-efeito de comportamentos e a usá-los, direcionados a outros, com a expectativa de obter uma resposta.

“O bebé percebe então o que é comunicar, tem a noção de causa efeito na comunicação, sabe que pode regular o comportamento do outro para atingir fins específicos.”

Até por volta dos nove meses, as crianças não mostram sinais de compreensão linguística. Percebem a entoação da fala, mas não percebem as palavras que lhe são ditas.

A comunicação entre os pais e o bebé começa muito antes da aprendizagem das primeiras palavras.

Paula Bravo

Terapeuta da fala

A partir dos 12 meses

Progressivamente, o bebé deixa de ser essencialmente reativo e começa a ser cada vez mais ativo na exploração do meio ambiente, da descoberta do mundo. 

É com o despoletar do interesse pelos objetos (olhar, tocar, agarrar, abanar…) que a criança avança para um outro nível: utilizar os objetos como foco de interesse entre ela e as outras pessoas.

Desenvolve a sua capacidade de atenção conjunta, outro pré-requisito para a aquisição da linguagem.

“O bebé está pronto para perceber a direção do olhar do outro, seguir os movimentos da cabeça do outro e olhar para onde o adulto olha e/ou aponta. Começa assim aperceber o que o outro quer e diz quando aponta e nomeia objetos”, explica Paula Bravo. 

Aos nove, dez meses começa a compreender o “não”, a dizer a primeira palavra e a usar “mamã” e “papá” com significado.

O bebé já percebe palavras

O olhar alternado entre a pessoa e o objeto e o apontar permitem à criança começar a dar nomes aos objetos e a atribuir rótulos.

Estabelecem-se, assim, as bases da compreensão verbal. Quando o bebé começa a perceber que as coisas têm nomes, já percebe algumas palavras. 

Em determinadas situações pode estar pronto para começar a falar e aos 12-15 meses, a linguagem oral começa a fluir. 

“Começa a ser usado um código arbitrário de linguagem e fala para descrever tópicos comuns, a usar a palavra num contexto, e a linguagem oral torna-se o meio privilegiado de comunicação. Contudo, as estratégias não verbais continuarão, toda a vida, a constituir grande parte do reportório comunicativo”, diz.

A primeira comunicação é quase animal: a suavidade ou a firmeza do toque, o contacto do olhar, o cheiro, o tom da voz, a expressão facil da mãe.

Teresa Sameiro

Terapeuta da fala

Sinais de alerta no primeiro ano

Os pais comunicam com o bebé de forma tão espontânea, que por vezes nem se apercebem do quanto estão a estimular tão intensamente assuas capacidades. 

Apologista da prevenção precoce de distúrbios relacionados com a fala, Paula Bravo aponta para alguns sinais de alerta nos primeiros meses: alterações no contacto do olhar, com a alimentação ou o sono ou choro constante e ausência de sono.

Não olhar para onde o adulto aponta, não gesticular, aninhar-se ou procurar consolo são outros sinais menos positivos.

Do primeiro ao segundo ano

Do primeiro ao segundo ano, o bebé mostra uma compreensão aumentada de palavras e de frases, dentro ou fora de um contex- to. Vai compreender palavras referentes a familiares (“pai”, “mãe” e “avó”), a objetos (“livro”, “cadeira”), a partes do corpo (“nariz”, “barriga”) e ações (“dormir”, “banho”).

A criança identifica imagens, presta atenção a novas imagens e, pouco a pouco, escuta pequenas histórias contadas, pelos pais, avós ou outro adulto.

Usa uma cadeia de sons, pertencentes à sua língua materna, imitando a melodia e entoação de um verdadeiro discurso, claro que sem palavras ou com poucas palavras reconhecíveis.

Pode-se dizer que sabe a música do discurso, mas ainda não a letra, explica Paula Bravo. Usa onomatopeias (ão-ão, brrr); a mesma palavra pode servir para várias frases, por exemplo “bola” pode querer dizer “onde está a bola?”, “olha a bola” ou “quero a bola”). O bebé combina palavras (“mamã papa”, “popó pai”) e adquire cada vez mais vocabulário, tais como substantivos, verbos e até alguns adjetivos. “A criança vai começar a usar a comunicação para protestar, a fazer birras, a atirar-se para o chão, tudo isto significa que já tem intenções comunicativas”, reforça.

A partir dos dois anos

Por volta dos dois, três anos, dá-se um boom na linguagem: cada palavra é entendida como tendo uma função.

O bebé já compreende a palavra em termos funcionais (“… é para comer”). Presta atenção a histórias cada vez mais compridas e torna-se um verdadeiro aventureiro do mundo. Há umagrande expansão do vocabulário. Os bebés com estas idades falam de si na terceira pessoa, mas aos três anos passam a usar o “eu”. 

Outra conquista é que já usam pronomes (“meu”, “teu”) e começam a introduzir e alterar tópicos de conversa. Estão crescidos e exprimem emoções através da palavra.

A fantasia surge como não tendo limites e os bebés começam a usar a linguagem de forma imaginativa. Os pormenores descritivos facilitam a sua compreensão.

Sinais de alerta no segundo ano

São sinais de alerta a não aquisição de linguagem nesta fase ou a criança adquirir palavras, mas entre os 18 meses e os dois anos e meio deixar deas pronunciar e não evoluir mais. Não imitar, com tom de troça, o modo de falar da criança e não obrigar a criança a repetir sistematicamente aforma correta de se expressar são importantes fatores a ter em conta pelos pais.

Estratégias para os pais

Referência internacional na área da linguagem, Margery Rappaport propõe estratégias para os pais promoverem e estimularem a linguagem do bebé desde a nascença. Além de contribuírem para o desenvolvimento do bebé, os pais estão a criartempo de qualidade e de diversão em família.