Saiba como ter um parto mais rápido e fácil segundo Michel Odent, o médico que revela o que a fisiologia moderna do século XXI nos diz acerca da forma como nascemos.
Texto: Ana Margarida Marques

Em entrevista, Michel Odent, obstetra francês e especialista em nascimento, explica que a forma como nascemos tem repercussões a longo prazo na vida. Com experiência de mais de meio século a assistir partos em hospitais e em casa, o médico de 90 anos já percorreu o mundo para falar aos profissionais que lidam com o parto sobre o que a ciência está a descobrir acerca do amor e do nascimento.

As hormonas desempenham um papel chave durante o trabalho de parto, avança o obstetra, com base na experiência da sua prática clínica e investigação científica: “A adrenalina é uma hormona de emergência que os mamíferos, incluindo os mamíferos humanos, libertam, por exemplo, quando estão assustados, quando se sentem observados e quando sentem frio”. Como explica o médico, na presença da adrenalina, não é possível libertar ocitocina, hormona que é fundamental na contração do útero e, consequentemente, essencial para o nascimento do bebé, bem como a saída da placenta. Durante a amamentação a mulher também liberta a hormona ocitocina. A libertação de ocitocina é ainda libertada durante as relações sexuais, daí que seja comum a referência “hormona do amor”.

Necessidades da mulher

Na sociedade atual continua a não haver um entendimento do parto fisiológico, e as pessoas desconhecem que a mulher precisa de um ambiente apropriado para libertar a hormona ocitocina, entende Odent. É essencial compreender que o ambiente deve proporcionar as condições básicas para a mulher ter um parto mais fácil e rápido, defende.

“No trabalho de parto, a mulher deve poder recolher-se no seu ambiente e comportar-se de um modo considerado inaceitável à luz da sociedade civilizada”, refere Odent, continuando: “A mulher deve poder gritar, ser rude e incorreta, colocar-se em posições inesperadas, frequentemente primitivas, comportar-se como um mamífero. Quando fica fora de si, significa que perde o controlo do neocórtex (cerebral). E esta é a chave para tornar o parto possível. Entendendo isto, podemos dizer que a mulher precisa de estar protegida contra qualquer espécie de estimulação cerebral durante o trabalho de parto”, acrescenta.

A adrenalina é uma hormona de emergência que os mamíferos, incluindo os humanos, libertam, por exemplo, quando estão assustados, quando se sentem observados e quando sentem frio.

Michel Odent

Obstetra

Estratégias básicas

É graças ao neocórtex (cerebral) que somos racionais e que comunicamos com a fala, por exemplo. A sua ativação deve ser interrompi- da durante o processo do nascimento. Neste sentido, “uma mulher durante o parto necessita de silêncio” (a linguagem deve ser evitada para não estimular respostas da parte da mãe), “de segurança” (não deve sentir medo), “de privacidade” (não deve sentir-se observada) e “de estar num local aquecido” (sem frio), refere Odent. Sabe-se que existe uma hormona chamada melatonina, libertada na escuridão, cujo efeito é reduzir a atividade do neocórtex. Assim, “o parto também pode ser mais fácil se não houver luzes fortes”, sugere o obstetra.

Na opinião de Odent, a mulher tem benefícios quando tem ao seu lado uma parteira ou uma doula (mulher que aconselha, acompanha e dá assistência física e emocional, não clínica, durante o parto), “silenciosa e vista como uma figura materna”.

Por fim, o médico alerta ainda que “hoje existem muitas mensagens visuais provocadas pelo efeito de vídeos na internet e na televisão, com partos naturais, particularmente difundidos pelos movimentos de partos naturais. São geralmente imagens em que se vê uma mulher no parto rodeada de uma, duas ou mais pessoas, incluindo o homem e a câmara de vídeo. Chamam-lhe parto natural, mas o ambiente não é natural”.

No trabalho de parto, a mulher deve poder recolher-se no seu ambiente e comportar-se de um modo considerado inaceitável à luz da sociedade civilizada.

Michel Odent

Obstetra

Gerir o ambiente hospitalar

Sabemos que o ambiente hospitalar e das salas de parto caracteriza-se como sendo “frio”, “metálico”, com “luzes fortes” e na presença do olhar de vários profissionais de saúde. Como pode a mulher reunir as necessidades básicas para o trabalho de parto, referidas pelo especialista? Michel Odent responde: “Mesmo nos grandes hospitais é possível que as mulheres fiquem em silêncio e é necessário que encontrem estratégias alternativas de forma que consigam satisfazer as suas necessidades básicas” (recolher-se, pedir para baixar as luzes, solicitar a presença do pai ou outro acompanhante, por exemplo). 

Necessidades do bebé

Após nascer, também o recém-nascido tem necessidades básicas. Colocar o bebé em contacto direto e precoce com a mãe facilita a sua adaptação à vida extrauterina. “Quando o bebé nasce não existem micróbios no seu corpo, mas mais tarde milhões de micróbios vão ocupá-lo.” Como explica Odent, idealmente, os primeiros micróbios a ocupar aquele território deveriam ser os da mãe. “É uma forma de explicar que este período crítico pode ser uma oportunidade para o bebé encontrar o peito da mãe (facilitando o processo de amamentação)”, avança o obstetra.

Saída da placenta

O parto não acaba com o nascimento do bebé. Com a saída da placenta, dá-se a terceira fase do parto, termina Michel Odent: “As mulheres têm a capacidade de libertar o maior pico de ocitocina que alguma vez tiveram em vida logo após o nascimento do bebé”, diz o médico. Para que tal aconteça, também aqui a mãe não deve sentir frio, deve sentir o contacto com o recém-nascido, olhar para ele e sentir o seu cheiro, conclui o especialista francês.

As mulheres têm a capacidade de libertar o maior pico de ocitocina que alguma vez tiveram em vida logo após o nascimento do bebé.

Michel Odent

Obstetra

Ideias-chave

Durante o parto a mulher necessita de:

  • silêncio;
  • segurança;
  • privacidade;
  • estar num local aquecido;
  • num ambiente sem luzes fortes.

Após nascer, colocar o recém-nascido em contacto direto e precoce com a mãe:

  • facilita a sua adaptação à vida extrauterina;
  • permite encontrar o peito da mãe, ajudando no processo da amamentação.